O Granja de Freitas é um bairro localizado na zona leste de Belo horizonte.
Em 2019 , acompanhando meu amigo John, artista que já havia feito um mural no bairro, fui conhecer esse bom lugar.
Fiquei surpreso com a quantidade de possibilidades! Havia muito espaço para pinturas, paredes de muitos formatos , tamanhos, o cenário era perfeito para intervenções de arte urbana. Saí de lá com a cabeça fervilhando de ideias e imaginando a quantidade de artistas que poderiam pintar por la.
Me organizei e voltei para pintar no Granja, a pintura foi na casa do sr. Marcolino.
O processo da pintura, durou alguns dias, e nesse período conheci a família que morava ao lado de onde eu estava executando o trabalho. Tive boas lembrança daquela família de gente finíssima, com uma conversa boa. O senhor Wilson e a Dona Sônia sempre me convidavam para almoçarmos juntos, pessoas do bem aquelas .
Ao concluir minha pintura, me despedi com a promessa de pintar a parede dessa família que me acolheu tão bem.
Com a proposta de voltar, aproveitei para colocar as ideias em ordem. Reuni a maioria dos amigos artistas que pude,e falei do bairro e suas possibilidades. Mas era muito além de entrar no bairro e fazer nossas pinturas e intervenções, afinal de contas éramos um grupo de estranhos que iriamos entrar no espaço daquelas pessoas. Era importante organização e respeito por aquele espaço que não era nosso. Portanto, nos organizamos com tudo que acreditávamos ser necessário, agendamos visitas no local e conversamos com moradores. Estabelecer esse primeiro contato, demostrando a seriedade das intenções e o respeito pelo espaço, e por cada morador, nos rendeu muitos pontos positivos para executar o projeto.
No dia marcado, estávamos la para dar inicio aos trabalhos! Ver a movimentação na rua, as pessoas se ajudando, as paredes ganhando cores a cada minuto que passava, perceber a mudança do clima do lugar, tudo acontecendo foi prazeroso e satisfatório.
O Graffiti me proporcionou muitas coisas, como amizades, momentos bons e ruins, possibilidade de um norte profissional, senso de responsabilidade quanto a mim e ao meu próximo, e muita vivência. O Granja foi mais uma dessas coisas, a cada pintura, a cada lugar, a relação com pessoas de todas as classes, tudo isso faz com que eu me sinta melhor espiritualmente. Creio que as energias nos ensinam muitas coisas, sejam elas positivas ou negativas.
No Granja fiz novos amigos, como o Gabriel, mais conhecido como Macarrão! Um guerreiro, fotografo talentoso, um cara que quero levar para a vida toda, um verdadeiro exemplo de ser humano.
Eu fui criado na periferia de São Paulo, e foram as pessoas de lá quem me deram oportunidade de no início, ainda com pouca técnica e talento, desenvolver meus primeiros trabalhos. Hoje com a bagagem que carrego ate aqui, com técnicas aperfeiçoadas e mais capacitação, me sinto em casa quando tenho a oportunidade de pintar nas periferias, e assim me sinto como que retribuindo a essas pessoas por tudo que me possibilitaram no inicio da minha história. E seja onde eu estiver, sei que vou sentir essa energia por que sei bem de onde eu venho, afinal de contas já dizia o poeta, “quebrada é quebrada em qualquer lugar”.
A diferença da recepção é absurda! Quando pintamos nas periferias nos sentimos bem vindos naquele lugar, os moradores querem que você fique bem, te oferecem tudo o que podem para que você se sinta assim. O que não se pode perceber em bairros de classe média alta e classe alta, até o mínimo como um copo de agua na maioria das vezes não lhe é oferecido, a energia muda, não se nota uma rua “viva”, são vazias, sem história. É triste pensar o quanto muitas dessas pessoas acreditam de verdade que são melhores.
Mas se me pedir para retratar como é pintar em favelas, ou bairros distantes dos grandes centros, a energia é outra e por ali tem vida e muita história para contar. Você chega sem conhecer ninguem e pouco tempo depois você esta almoçando com uma família que nunca te viu! As ruas estão efervescendo vida com trilha sonora e tudo o que mais tem direito. As pessoas são definitivamente mais humanas e empáticas. Conheço histórias de pessoas que se tornaram amigos a ponto de sair do seu estado e ir para o outro, para passar o dia das mãe com a família que nessa troca toda acabou se tornando dele também.
Histórias como estas escutamos com frequência, porem melhor que escutar histórias, é viver elas! Sou muito grato a Deus e também, pelas minhas decisões que me guiaram para tudo isso. O Granja foi um projeto simples, mais foi com muito respeito e seriedade . Em pouco tempo, já são mais de 15 murais produzidos. Poder registrar tudo para eternizar esses momentos foi fundamental. No vídeo não aparecem todos pois os artistas pintaram de forma independente cada um no tempo que havia disponível.
O Granja de Freitas se tornou uma galeria a céu aberto, descentralizando esse conceito e contrariando a logica convencional, de centros boêmios. Na minha opinião, ele aconteceu no melhor lugar, como foi dito pela frase no mural do amigo e artista Leoni.
Obrigado a todos que participaram de uma forma ou de outra, aos moradores pela confiança e carinho com todos os artistas, e a cada artista que vestiu a camisa e foi para a luta, acreditando no seu trabalho e na beleza do projeto, dedicando seu tempo e recursos para isso.
Esse foi um trabalho totalmente independente, sem fins lucrativos. Cada artista arcou com suas despesas, materiais, transporte, estrutura de andaimes, escadas e o que mais foi necessário para que essa ação acontecesse.